O consumo de bebidas alcoólicas durante a gestação pode comprometer de forma severa o desenvolvimento cerebral do feto. É o que revela uma pesquisa realizada por cientistas do Laboratório de Bioinformática e Neurogenética (LaBiN) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). O estudo reforça os impactos do etanol (EtOH) — substância ativa do álcool — sobre a formação de redes neurais e a compactação do DNA, com consequências que podem se estender por toda a vida.
Segundo os pesquisadores, a exposição ao álcool altera a organização da cromatina, estrutura que regula o funcionamento genético, e afeta a formação de circuitos cerebrais ainda em estágio embrionário. Isso pode desencadear o Transtorno do Espectro Alcoólico Fetal (TEAF), quadro que abrange deficiências físicas, cognitivas e comportamentais e que, em muitos casos, é confundido com o autismo — sobretudo nos primeiros anos de vida.
“Nos Estados Unidos, estima-se que 1 em cada 20 nascimentos seja afetado pelo TEAF. No Brasil, infelizmente, ainda não há dados consolidados sobre a incidência”, afirma o coordenador do LaBiN, Roberto Hirochi Herai.
A pesquisa ganha ainda mais relevância diante do crescimento do consumo excessivo de álcool no país. Dados do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) mostram que, entre 2010 e 2023, o percentual de mulheres que fazem uso abusivo de bebidas alcoólicas subiu de 10,5% para 15,2%. Entre gestantes, os riscos são ainda mais alarmantes, já que não existe comprovação científica de uma quantidade segura de álcool durante a gravidez.
Para Bruno Guerra, coautor do estudo, compreender os efeitos moleculares do etanol sobre o cérebro fetal é essencial para desenvolver estratégias de prevenção e tratamento. “Mapear as alterações causadas nas células cerebrais pode abrir caminhos para futuras terapias e, sobretudo, ajudar na formulação de políticas públicas de conscientização voltadas a mulheres grávidas”, explica.
Os pesquisadores destacam que o TEAF ainda é subdiagnosticado e pouco discutido no Brasil, o que dificulta o acesso a cuidados adequados e perpetua casos de exclusão social e educacional. A recomendação dos especialistas é clara: a única forma segura de proteger o bebê é evitar completamente o consumo de álcool durante toda a gestação.