Cíntia Santos
A recente decisão do Conselho Federal de Biologia (CFBio) de autorizar biólogos habilitados em Biologia Estética a realizarem procedimentos estéticos com injetáveis reacendeu uma antiga polêmica sobre a atuação de diferentes categorias da saúde na estética. A Resolução nº 734, publicada em 5 de maio de 2025 pelo Conselho Federal de Biologia (CFBio), regulamenta a atuação de biólogos habilitados em Biologia Estética em procedimentos com substâncias injetáveis, como toxina botulínica, bioestimuladores e fios de PDO.
A decisão, no entanto, resgata antigos embates com o Conselho Federal de Medicina (CFM), que já havia conseguido, em 2023, a suspensão de uma norma anterior semelhante. Na época, a Justiça Federal entendeu que os biólogos não têm respaldo legal para atuar em procedimentos invasivos ou estéticos em pessoas vivas, com base na Lei 12.842/2013, que estabelece como privativos dos médicos os procedimentos invasivos e terapêuticos.
Segundo o CFBio, a nova norma representa “um avanço significativo na consolidação da atuação dos profissionais da Biologia na interface entre estética e saúde”, desde que os profissionais tenham formação adequada, com carga horária prática presencial supervisionada.
Para a médica dermatologista Marília Acioli, a decisão segue uma tendência de várias profissões em ampliar sua atuação para a área estética, o que exige atenção redobrada. “A profissão do biólogo tem uma base muito sólida em fisiologia e biologia celular, mas quando falamos de procedimentos injetáveis, é preciso muito mais. É fundamental estar habilitado a lidar com complicações. A formação tem que ser rigorosa”, alerta a dermatologista.
A biomédica esteta Juliana Freitas também demonstra preocupação. Segundo ela, a formação dos biólogos não garante preparo suficiente. “Apesar da grade curricular ter matérias voltadas ao corpo humano, sabemos que esse não é o foco principal da formação do biólogo. Como alguém sem conhecimento teórico e prático pode aplicar um procedimento que envolve todo o funcionamento do corpo, apenas com uma pós ou curso livre?”, questiona Juliana.
A resolução do CFBio exige que os biólogos estejam habilitados por graduação, pós-graduação lato sensu ou cursos com carga prática supervisionada. Mas, para Marília Acioli, isso ainda é insuficiente diante das possíveis complicações desses procedimentos. “Não se trata apenas de injetar. O profissional precisa reconhecer os primeiros sinais de complicação e saber agir rapidamente. Hoje, quem geralmente precisa resolver esses problemas é o médico”, ressalta.
Outro ponto levantado por Juliana Freitas é o impacto no mercado estético, que pode sofrer com a banalização de técnicas complexas. “O mercado da estética é muito amplo. Muitos que estão começando oferecem preços mais baixos, mas o risco é alto quando falta conhecimento e prática. Isso prejudica quem se dedica anos à formação e traz má fama a toda uma classe”, afirma.
Marília também pondera sobre o acesso ampliado aos procedimentos, o que pode baratear os serviços, mas reforça a necessidade de cautela por parte dos pacientes. “A estética envolve saúde. O paciente não pode ser penalizado. O mais importante é buscar um profissional experiente, que saiba lidar com complicações. O resultado só é maravilhoso se a saúde não estiver em risco”, alerta.
A decisão do CFBio também permite aos biólogos prescreverem vitaminas, aminoácidos, toxina botulínica e outras substâncias classificadas como nutracêuticas e cosméticas. Além da execução de procedimentos, eles poderão assumir responsabilidades técnicas em clínicas, ser consultores e emitir pareceres científicos.
No entanto, tanto Juliana quanto Marília convergem em um ponto: o debate sobre a formação e habilitação para atuar com procedimentos invasivos precisa ser transparente, técnico e centrado na segurança do paciente.